quinta-feira, 25 de junho de 2009

Duas certezas

Rio de Janeiro em uma noite frio de outono, precisamente, num sábado à noite, tal como canta e quiçá profetizava a música. Neste horário noturno os acontecimentos são normais, ainda mais se tratando do cerne da boêmia carioca, portanto há amores com compromisso, sem compromisso, alguns momentâneos, outros levianos e até os “modernos”, aos quais não gosto, não obstante a respeitar a preferência alheia. Enfim, vemos de tudo neste circo terrenho ou voador, mas seja lá qual for é o que vivemos, contudo perante o cotidiano carioca algo me salta os olhos e refiro-me àquele fato insólito. Sim, é um quadro pintado por Tarsila de Amaral, uma música composta por Tom, Toquinho e Vinícius, a qual ao ser cantada conta com a participação da Miúcha para maior abrilhantamento, vejo um filme, com todo roteiro, produzido por Fernando Meirelles ou apenas uma obra de arte escrita por José Saramago, isto é o presenciado nesta noite.

Pois, eu parei, por alguns minutos, o quê fazia e não me importava para onde ia, somente, com intuito de prestar atenção ali, como faço ao me deparar com obras primas do escol supracitado. Aquele garoto, detentor de minha atenção, vendia bala no desvão da madrugada, a fim de ajudar sua mãe, esta sua companheira de labuta, e logo o estranho homem perguntou: Quanto custa o cigarro? E o menino, disse: Dez pilas. O homem pediu um e retorqui: Tá feito, mas faz por oito? Então, o mancebo abaixou a cabeça e disse que iria comunicar sua progenitora e, no instante seguinte voltou, não houve acordo, visto isso só haveria negócio com as dez pilas. Era de se esperar a conclusão e a venda, uma vez que a sede do cigarro para o fumante é saciável custe o que custar, conquanto o estranho homem retorquiu, pela última vez: Tome dez, mas peça dois para sua mãe. Assim foi o desfecho, o qual para muitos é normal e nada para acrescentar, enquanto a minha vista é, simplesmente, no mínimo, por deveras incomum.

Entrando rapidamente no mérito de uma criança trabalhar de modo que caso não o faça terá ausência em sua mesa, pois sua família não tem meios para sustentá-la, e assim sendo algo pesado em excesso para uma mente ainda a descobrir o mundo entender, somando e agravando o fato de ser àquela hora em tal ambiente. Porém, no mundo vivido por nós é uma situação banal, posto que os jovens deixarem de brincar para trabalhar é habitual e pouco interessa o local ou horário, consequentemente minha mentalidade que vê nisso um absurdo é, por total, obsoleta. Okay, sem protestar muito, irei aceitar. Todavia, o estranho homem de óculos e sedento por uma tragada de cigarro e aquela criança pequena com cabelo curto e rosto pueril protagonizaram uma cena incrível, na qual há, para mim, duas certezas. Na primeira, vejo um inefável jovem que está ali por que deve estar e em sua face existem mostras patentes de inocência, como uma garota ainda antes do rompimento do hímen, portanto uma flor pueril. Na segunda, por fim, vejo uma criança induzida para obtenção do poder, do ganho financeiro, na luta por dinheiro, após aquele sorriso maroto, de canto de boca, quando o estranho pronunciava a quantia ou percentual pecuniário, para os mais entendidos, destinado ao garoto, por conseguinte deixando de ser infantil para se tornar um incipiente cliente da sociedade obtentora de lucros, a qual naquele momento conseguia aliciar e angariar uma ex-criança. E foi neste átimo que vi o sangue, do hímen, escorrer pela calçada.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Presente

Conjugue verbos no presente, ele é assaz
Use o pretérito apenas como experiência
Tal qual um presente que não volta mais
Não viva o passado

Conjugue o presente
Apenas com ele conjugará o futuro
E se o presente não for bom
Para novos o usará e não cometerá os mesmos erros

O presente deve ser conjugado
Quiçá sonhando o futuro
O pretérito, apenas, e só, relembrado
E assim viverá um amor sincero e puro.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Reminiscências

As reminiscências acodem os tempos dos quais eu apetecia crescer, época dos quatro, cinco, seis, sete ou seja lá a pouca idade somada que tinha, e meu âmago era obstinado em alcançar a genética do crescimento. Porém, a saudade com requinte duro e árduo de nostalgia e covardia, abata-me o peito, do tempo em que a vida era, simplesmente, vivida, sem compromissos, sem preocupações, sem cotidiano. Sobretudo, sem entender os adultos, os porquês deles, as razões por quais franziam a testa, as discussões de um com outro, os sentimentos, seja em excesso ou em falta. Não, da vida eu nada entendia, e ainda assim o sorriso era permanente, era inocente, pudico, pueril, como era bom ser infantil. Agora, já sei viver, estou contaminado pelos adultos, há em mim o que jamais entendera quando pequeno. Entretanto não me amarguro, pelo contrário, lembro feliz o modo como aproveitei, mormente ao ver aquela senhora andar de mãos dadas àquela criança, de mochila nas costas, caminham a perder de vista, tal qual fazia com a minha saudosa e querida avó, ah tempo bom!

Mas, confesso, se pudesse voltaria o tempo ou pararia o que cá estou, pois doravante sentirei saudades do hoje, o qual tratarei por outrora. E esta paradoxalidade é inerente ao ser humano, ao adulto, é em um breve suspiro quando alguns sais esvaem-se fugitivamente, e vejo que realmente cresci.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Compunção da lua

O céu estava crispado, com olhos quase fechados, dentes cerrados, e só a natureza noturna saberá o porquê ou, talvez, nem ela encontrará os motivos justos para tamanha austeridade celeste. No entanto, debaixo daquela cabana, similar a um faroeste do século passado ou um luau do século contemporâneo, onde tocavam músicas e jovens ouviam-na para alegrar a jogatina e bebedeira, dois olhares e rostos nunca dantes cruzados se acharam como desde o nascimento estivessem a se procurar. Neste átimo, em que ele e ela trocaram olhares e algumas palavras breves sem intenções, sejam elas primeiras ou décimas, ao menos, da parte dela, a cortina acinzentada sobre nossas cabeças se desfez e transformou o pranto da lua, escondida, em sais de alegria, graças à união mesmo fugaz daqueles dois pares de pestana. Porém, por motivos desconhecidos a nós, meros mortais, aquela turma se viu obrigada a dissipar-se e abreviando, abruptamente, a conversa, sobretudo esvaindo os olhos de um dos olhos doutro. Doravante, não saberemos quando o calor das vistas dela reencontrará as dele, se é que um dia irá acontecer mais uma vez, só temos a certeza acerca de suas conversas, as quais jamais se findarão, pois a lua será o pombo correio, enviando e entregando as mensagens ininterruptas e, mormente, enamoradas. Contudo, a última imagem é do céu coberto como outrora e o choro perene da lua, em virtude daquela dispersão.